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Este grande livro, da autoria do historiador John Darwin (Oxford), é uma sublime tareia na visão eurocêntrica do mundo. Esta sova historiográfica começa logo na pergunta de partida: como perceber a actual globalização marcada pelo sucesso das nações asiáticas?
John Darwin começa por dizer que uma história global dos últimos séculos não pode ser centrada apenas nos europeus/ocidentais. O imperialismo não foi o pecado original da Europa. Povos não-ocidentais (otomanos, persas, chineses ou japoneses) também construíram os seus impérios. E - este é o ponto-chave - a história da economia global é, desde há séculos, uma história de interligação entre as experiências imperiais ocidentais e os grandes poderes da Eurásia (China, Índia, Japão, etc.). A globalização não é um projecto eurocêntrico; a globalização foi e é uma articulação, tensa e conflituosa, entre ocidentais e asiáticos.
E nesta questão da globalização, defensores (liberais) e críticos (marxistas) do Ocidente liberal são mais parecidos do que parecem. Os liberais falam da "modernização" que o Ocidente transmitiu ao mundo. Os marxistas falam da "exploração" que os ocidentais impuseram ao resto da humanidade. Mas, como salienta Darwin, estas duas escolas rivais partilham o mesmo pressuposto errado: a certeza inquestionável de que o Ocidente foi e é o único motor da história; o homem ocidental é visto como o único actor; o homem asiático é encarado como um ser passivo, que aguarda bucolicamente pelas acções, benignas ou malignas, do Ocidente. Darwin critica o eurocentrismo gémeo de liberais e marxistas, reafirmando que a globalização não é um projecto desenhado no estirador iluminado do Ocidente.
As nossas crianças aprendem na escolinha o seguinte: no século XVI, os navegadores portugueses despertaram os adormecidos povos do Índico para os benefícios do comércio. Ora, isto é um mito. Darwin mostra que a economia global não foi criada pelo Toque de Midas dos mercadores europeus. Antes da Era Vasco da Gama, já existia uma forte actividade comercial entre Índia, China, Japão e costa oriental de África. Se quisermos, já existia uma "globalização" asiática antes de as caravelas darem um ar da sua graça. Perante este cenário histórico, percebemos que o actual triunfo das economias asiáticas não representa uma emergência inesperada; representa, isso sim, uma re-emergência previsível. É bom lembrar que em 1750 existia um equilíbrio económico entre a zona europeia e a zona asiática (China e Índia eram as maiores economias do mundo). Hoje, a grande divergência económica entre o Ocidente e a Ásia (que ocorreu entre meados do século XIX e meados do século XX) está a dar lugar a uma grande convergência. Os asiáticos estão a recuperar o lugar que lhes pertence. Estamos a voltar ao equilíbrio de 1750. Nos últimos anos, devido à crise transatlântica, muitos intelectuais assinaram a certidão de óbito do Ocidente. Enganaram-se. Aquilo que morreu recentemente não foi o Ocidente (projecto político e moral), mas sim o eurocentrismo (o hábito intelectual que coloca o espaço euro-atlântico no centro do mundo, como único factor de acção e mudança). O período de total predomínio ocidental sobre o resto do mundo foi apenas um pequeno interlúdio do qual os nossos avós e pais usufruíram. Nós, em 2007, já não fazemos parte dessas gerações de ocidentais privilegiados. A era da tutela ocidental sobre o resto do mundo acabou. Habituemo-nos.
Henrique Raposo in Jornal Público, 21/05/2007